Por que o senhor não está fazendo greve?
Eu não sou contra a greve em si. Sou contra a forma de seu encaminhamento e contra o corporativismo. Essa greve tem um “fundo” de defesa do corporativismo. Não houve discussão nas bases. Por mais que eu tenha o maior respeito pela ADUFF enquanto espaço histórico e pela sua direção, acho que uma greve deve ser construída – passar pelos institutos, passar pelos departamentos e, com isto, ser referendada.
O senhor concorda com o professor Aarão Reis que a greve não é um modo de luta adequado às universidades?
No meu entendimento, a greve é uma forma de luta de qualquer trabalhador. Assim como o empresariado pode fazer lock-out, o trabalhador pode fazer greve. A questão é o momento. Esta greve não é meramente profissional – existe um fundo político-partidário (como também nas outras). No momento, os partidos à esquerda e à direita do governo estão aproveitando esta greve para fustigá-lo; não é à toa que os aparelhos privados de hegemonia ligados ao PSDB, chamados Folha de São Paulo, Estadão, O Globo, tão dando este cartaz todo. Nunca deram! Na época do FHC, que teve greves grandes como esta, ou maiores, nenhum jornal dava este cartaz. Tem uma certa legitimidade nas reivindicações? Sim. Agora, tem algumas que não têm.
Por exemplo...
Por exemplo o plano de carreira. Existe a necessidade de se fazer um plano de carreira novo? Há, pois no corpo de docentes da UFF, se você quiser, você fica ad perpetuum ganhando um bom salário sem fazer nada. Existe um problema muito sério no funcionalismo público, que não é a estabilidade profissional, mas o fato de nós nunca contribuirmos para o teto. Que temos que ganhar bem, temos. Que temos que discutir a questão do produtivismo, temos e é fundamental.
Algumas lideranças dos movimentos estudantis dizem que os professores que não estão fazendo greve não o fazem porque têm outras fontes de renda. O que o senhor acha disso?
Não é nada disso! É óbvio que isso não é verdade! Essas pessoas não sabem nada. Tem muitos professores que não estão fazendo greve que não são “pelegos”, como afirma a militância. Já fizeram greve outrora. Eles não concordam na forma como a greve foi encaminhada pela ADUFF. Vamos parar com esse macarthismo. Eu fico espantado com essa garotada que se diz de esquerda usar artifícios de direita pra promover sua luta. Na assembleia da ADUFF do dia 22/05, que referendou a greve, eu discordei dos colegas (eram 92 presentes e eu fui o 92), pois no meu entendimento 130 professores (da assembleia do dia 10) não são suficientes para tirar e legitimar uma greve para um universo de 2950 professores. Que isto! Vamos construir direito. A greve deixou de ser uma questão só da corporação. Agora existe uma questão político-partidária muito grande. É legítimo? É. Mas não é no que eu acredito. Os alunos tão em greve? A grande maioria está em casa. Fazendo o que? Professores não estão vindo à UFF, porque vão encontrar um abandono (embora o ICHF esteja aberto) e sem os alunos. Tem muita gente aguardando decisões da reitoria sobre a reposição de aulas... Reposições, aliás, que vão ser pífias, e isso enfraquece a universidade.
Muitos dos professores envolvidos são novos. Por que o senhor acha que isso se dá?
Eu tenho alguns problemas com isso. Os professores novos estão em muito melhores condições do que quando eu entrei. Quando eu entrei, eu era Assistente 1, com mestrado, salário pífio. Eu nunca vi tanto dinheiro e recursos de agências de pesquisa, e existem muitos editais na FAPERJ, no CNPq... Concordo que o salário estar ruim frente aos das outras categorias profissionais do poder Executivo (para não falar do Legislativo e do Judiciário), isso é um erro nosso, que temos que assumir. Agora, eu duvido que qualquer governo, mesmo sendo de esquerda, dará 15% de aumento.
Quanto à carreira acadêmica, o governo apresentou um novo projeto... O que o senhor acha que está ruim, como deveria ser?
Rapaz, com 23 anos de magistério já estou chegando no topo da carreira. Há uma necessidade de rever este plano. Agora, tem que se discutir isso mais serenamente. Porque, como destaquei, é possível se manter como adjunto 4 [um dos níveis da carreira de professor universitário, que requer doutorado] pra sempre, ganhando 6, 7 mil, sei lá quanto, e não fazer nada, dar suas aulinhas e tchau. Não há nenhuma cobrança. A discussão é complicada por causa dos ânimos exaltados... Eu particularmente acho que deve haver um plano de carreira diferente do proposto pelo governo, mas também diferente do da ANDES. Eu sou contra o igualitarismo. Tem que haver uma priorização pelo mérito. Eu falo isso tranquilamente, já tive bolsa de produtividade negada algumas vezes, hoje sou pesquisador do CNPq. Nasci sem padrinho, sou pagão... Sou contra o corporativismo. Essa greve é de defesa do corporativismo: por isso sou contra.
O que o senhor acha do apoio dos estudantes à greve dos professores?
É legítimo. Agora, tem que tomar cuidado, porque os estudantes devem ter suas próprias reivindicações. Tem estudante sério, mas tem estudante que não quer nada, que tá tomando vaga de outros. No meu entendimento, os estudantes-militantes têm que ser os melhores alunos. Pra poder falar na frente dos outros, dos tais “pelegos”, que são tão bons ou melhores do que eles, com notas melhores. Entretanto, não é assim. Não quero cometer equívocos mas, para minha tristeza, uma grande parcela da militância estudantil é composta pelos piores alunos, que estão aqui há 4, 5, 6, 8, 10 anos, tomando o lugar de outros. Isso é um absurdo. E outra coisa – o movimento estudantil tem que ir para além dos muros da universidades públicas. Tem que ir pras universidades particulares também. Lá, os alunos das universidades federais são conhecidos como a elite dos alunos (escutei isso numa conferência que proferi na Estácio de Sá do Madureira Shopping). Tem que ter um projeto pra sociedade civil como um todo, assim como a ADUFF (ANDES) e SINTUFF. O trabalhador que está no mercado privado, principalmente o que ganha salário mínimo, não sei se tá aplaudindo a greve. Acho que muito pelo contrário, tá chamando a gente de outra coisa. Eu queria saber quantos professores aqui fariam greve se pudessem ser demitidos.
O departamento de história se reuniu para discutir a greve?
Ainda não, vai se reunir semana que vem. O departamento, no entanto, não deve votar se vai entrar ou não na greve. Neste momento, os departamentos e os institutos devem discutir a greve, mas não tomar posições como um todo. Professores que estejam a favor da greve, que façam greve; os contra, que possam vir.●
Formei-me em 1996, e esse cara sempre foi de uma serenidade ímpar. Parabéns pela postura.
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