terça-feira, 15 de setembro de 2015

Luz Contorcida - Antonio Zelaquett Khoury

Antonio Zelaquett Khoury é professor associado do departamento de Física da UFF. É membro do Grupo de Óptica e Informação Quântica, sendo o professor responsável pelo Laboratório de Óptica Quântica.



Desde a antiguidade, a natureza da luz ocupou a mente de filósofos e pensadores. Esteve no centro de um debate entre o grande Isaac Newton e o holandês Christiaan Huygens no século XVII, no qual Newton sustentava que a luz era formada de pequenos corpúsculos, enquanto Huygens defendia que a luz era formada por ondas. As primeiras evidências experimentais apontavam fortes indícios em favor da teoria ondulatória até que, no final do século XIX / início do século XX, surgem a teoria quântica e a ideia da dualidade onda-partícula. Esta dualidade implica na coexistência de uma dupla natureza, onda e corpúsculo, tanto na luz quanto nos constituintes elementares da matéria, como elétrons, prótons e nêutrons. Este caráter dual intriga os cientistas até a atualidade e ainda é fonte de intensos debates, sobretudo por desafiar nossa percepção da natureza. De fato, é difícil conceber a coexistência de duas características que parecem ser mutuamente excludentes. Corpúsculos são percebidos como pequenos objetos localizados no espaço, enquanto as ondas constituem perturbações que se propagam e distribuem-se pelo espaço.

Apesar desta singularidade da visão quântica da luz, a maioria dos fenômenos luminosos do nosso cotidiano pode ser descrita em termos ondulatórios. Ainda que um conceito razoavelmente antigo, a propagação de ondas enseja características surpreendentes, que muitas vezes desafiam o senso comum. Sabemos que a luz transporta energia e outras grandezas físicas, como o momento linear, associado à quantidade de movimento de translação de um objeto, e o momento angular, associado à quantidade de movimento de rotação. É deste último que nos ocupamos no Laboratório de Óptica Quântica do Instituto de Física da UFF.

Quando duas ou mais ondas se superpõem no espaço, ocorre o conhecido fenômeno de interferência. Este fenômeno provoca uma redistribuição espacial da energia luminosa, que muitas vezes produz imagens ricas em complexidade e beleza. Por exemplo, ao iluminarmos o anteparo exibido na figura 1, a luz atravessará as partes brancas e será obstruída pelas partes escuras. Após o anteparo, a onda luminosa será composta pela superposição das ondas transmitidas, dando origem ao fenômeno de interferência, o qual distribui sua energia por feixes secundários que se propagam em direções específicas.
Figura1. Anteparo usado na produção do fenômeno de interferência luminosa



A superposição de ondas também pode produzir modos interessantes de propagação da luz, formando vórtices como num redemoinho ou num furação. Vórtices luminosos podem ser formados a partir de um laser comum utilizando-se o fenômeno de interferência. Partindo de um feixe laser com seção reta circular, utilizamos um anteparo que possui uma estrutura bifurcada, como a exibida na figura 2. Alinhando o centro do feixe incidente na bifurcação, sua energia é redistribuída sobre vários feixes secundários que resultam da interferência entre as ondas transmitidas pelo anteparo. Parte do feixe segue inalterado sobre a mesma direção de propagação incidente. Sobre os feixes secundários formam-se vórtices que se propagam em direções defletidas, simetricamente dispostas de cada lado do feixe inalterado, conforme mostrado na figura 2. Os vórtices dispostos de cada lado do feixe principal circulam em sentidos opostos.
Figura 2. Anteparo utilizado na produção dos vórtices e esquema dos feixes defletidos



A formação dos vórtices pode ser evidenciada utilizando-se novamente o fenômeno de interferência. Na figura 3 exibimos uma imagem obtida em nosso laboratório, formada a partir da superposição de um vórtice com um laser comum. O padrão de interferências construtivas (regiões claras) e destrutivas (escuras) exibe uma estrutura em forma espiral que revela a presença do vórtice.
Figura 3. Imagem de uma figura de interferência entre um vórtice e um laser comum


Além de sua beleza intrínseca, os vórtices óticos também são estudados por suas potenciais aplicações tecnológicas em diferentes contextos. Sabemos que eles podem ser utilizados no aprisionamento e rotação de pequenas partículas em montagens chamadas de pinças óticas. Além disso, os vórtices surgem naturalmente em certos tipos de fibras óticas e também podem vir a ser úteis em protocolos de telecomunicação. No Laboratório de Óptica Quântica do IF-UFF, dedicamos nossa pesquisa ao estudo dos vórtices em protocolos de transmissão e processamento de informação quântica, onde tanto a natureza ondulatória quanto a corpuscular da luz são necessárias. Esperamos que os vórtices tenham um papel importante em uma nova geração de tecnologia de informação.

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